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#10
O Começo de tudo
Naine Terena
Exposição individual
O Começo de tudo
Exposição individual de Naine Terena
Ensaio curatorial de Luciara Ribeiro
Naine Terena tem sua primeira individual na Galeria Carmo Johnson Projects, apresentando um conjunto diverso de trabalhos: máscaras com base em tecelagens, fotografias, obras instalativas e vídeos que evocam, traduções, atravessamentos e marcas de memória indígena.
"O começo de tudo" conta com um sensível ensaio curatorial escrito por Luciara Ribeiro, educadora, pesquisadora e curadora, que menciona: "Naine Terena tem atuado com enorme contribuição para áreas da curadoria, crítica de arte, educação e a gestão pública cultural-educacional. A exposição Véxoa, nós sabemos, curada por Terena, exibida em 2020, na Pinacoteca de São Paulo, se tornou um marco referencial na história da instituição e das artes nacionais, sendo reconhecida como uma das principais mostras recentes das produções indígenas contemporâneas. Diferente do lugar ocupado em Véxoa, na exposição O começo de tudo, pela primeira vez, a sala expositiva não será pensada por Naine Terena para abrigar trabalhos de outros artistas, mas sim as suas produções artísticas. Aqui, ela nos aproxima de uma faceta ainda pouco conhecida, a de artista".
A exposição nos possibilita apreender um pouco do começo da produção artística de Naine, que tem início na década de 1990, a partir das manualidades e das artes cênicas. Com essas referências a artista imprime tanto na expografia distribuições instalativas das obras, inspiradas nos encontros da cena teatral, tanto na confecção das obras têxteis, compondo então, os seguintes núcleos: Os outros; Eu sou uma árvore; Admirável mundo novo e Antes o mundo não existia.
Naine Terena confecciona uma série de “Máscaras” (2024) aproveitando elementos da técnica da tecelagem e os recodifica, para criar obras têxteis que materializam os ‘outros’ - tudo aquilo que habita este mesmo tempo-espaço mas não é identificado ou passa despercebido aos olhos humanos. Com base em processos de tecelagem comuns entre as populações Terenas. Seu trançado, diferente do usualmente presente na manualidade têxtil Terena, não busca a rigidez do planejado, da perfeição, do enquadramento e do calculado, ao contrário, visa ressaltar a noção do imperfeito, incompleto, insuficiente, inacabado. São linhas soltas, cortes sinuosos, pontos saltados, onde são incorporados restos de objetos que ela encontrou durante o processo da feitura, descartes jogados no solo, lixos, indícios do desprezo que a sociedade atual tem praticado com a saúde da terra. Em “Vovó” (2024), ela aprofunda o contato entre ciclos de tempo, entre o falar do agora com o escutar dos que vieram antes. Com a sabedoria proferida pelo tempo do presente e o tempo dos mais velhos, a artista-pesquisadora cria uma vovó entrecruzada por fitas, fazendo do gesto dançado dos dedos o firmamento para a presença de uma exuberante vovó, de enormes tentáculos que a eleva ao mesmo tempo que a apruma no chão.
Já a série “Eu sou uma árvore” é um experimento para a produção de uma materialidade dos pensamentos que conectam a humanidade a tudo aquilo que habita o mundo animal, vegetal e cosmológico. Naine Terena costuma lembrar que: Era um fim de tarde, no ano de 2020, quando sentei ao fundo da minha casa e tirei foto de uma das minhas plantas. Comecei a mexer nela a partir de inúmeros filtros, até que em um deles vi um pequeno sorriso que me gerou o pensamento: eu sou uma árvore! [Naine Terena]
O conjunto ‘Admirável mundo novo’, ou ‘um boot necessário’, cria a partir de um conjunto de sete latas de atum, que tem como conteúdo imagens feitas a partir da inteligência artificial, como a tecnologia reconhece ‘riqueza’, pobreza no Brasil, bem viver. As imagens parecem dialogar com fatos da vida real, como o ‘tokenismo’, o racismo ambiental, os locais de lazer particulares, o empobrecimento de uma boa parcela da população, refletindo se é hora de um boot necessário.
Por fim, o conjunto de vídeos, “Antes o mundo não existia” faz uma alusão às muitas histórias e cosmologias indígenas, utilizando o nome da obra literária escrita por de Umusi Pãrõkumu e Tõrãmu Kehíri, indígenas da região amazônica, para abordar a criação do mundo na perspectiva indígena e suas relações com presente e futuro. As imagens das cascas de coco, trazem constelações, importantes para os povos indígenas, ações climáticas, cores e formas que representam o mundo de antes e o mundo de agora. O mundo antes deste mundo, que nossos troncos velhos nos ensinaram a conviver em equilíbrio, e o mundo de hoje, onde as relações parecem ter sido rompidas por grande parte da população.
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